Bobbie Goods, a Polêmica e Sua Importância na Atualidade.
A série de livros de colorir Bobbie Goods se tornou uma polêmica recentemente, pois ele vem sendo o livro mais vendido na Amazon Brasil esse ano.
Aqui no blog fazemos o Top 5 Indicações e, de fato, a série vem desde o Top 5 Indicações de 20 de Fevereiro como Top 1 livro mais vendido e não saiu mais, a ponto de eu deixar claro que foram os livros mais vendidos e descer um pouco mais pra achar livros literários para indicar, já que a série Bobbie Goods chegou a ocupar do 1º ao 5º lugar no ranking de livros mais vendidos.
Não serei hipócrita aqui: eu também julguei!
Achei estranho que um livro de colorir fosse o livro mais vendido ao invés de ser um livro literário.
Só que essa minha perspectiva mudou e, para ser franca, tirei como base eu mesma!
Existe uma pressão social para que a gente só consuma conteúdos de qualidade, mas a gente só consome conteúdo de qualidade mesmo ou isso é apenas uma conversa para que a gente se sinta melhor sobre as escolhas que estamos fazendo?
Tenho certeza que muita gente leu muitos livros esse ano, mas tenho certeza que muitas tantas outras não leram nenhum!
Na nossa era globalizada, recebemos informações o tempo inteiro e do mundo todo. Nosso cérebro praticamente não para, principalmente se gastamos nosso tempo olhando as redes sociais. Aí é que não para mesmo. Recebemos informações das mais diversas, das fúteis às importantes, o tempo todo e intercaladas entre elas, gerando um misto de sentimentos e emoções que mudam em um piscar de olhos, literalmente. Você pode estar rindo de um meme, rolar o feeed e se deparar com uma notícia que te deixou indignado e seu humor mudar totalmente. Isso toda hora e o tempo todo.
A verdade é que a nossa mente está esgotada com tanto informação indo e vindo e é aí que entra uma atividade relaxante, terapêutica e extremamente necessária.
Uma coisa que eu faço que aquieta o meu cérebro é dobrar sacos plásticos.
Isso mesmo! O saco plástico que pegamos no mercado. Eu pego um a um e dobro como roupinhas e guardo em vasilhas para facilitar a escolha de qual saco plástico eu vou precisar: para lixo, um saco grande, um pequeno, um médio.
E enquanto dobro meus sacos (hahaha), minha mente fica quieta!
Eu não preciso elaborar uma lógica, eu não preciso pensar no que estou fazendo. É uma atividade mecânica. É fazer algo útil sem, necessariamente, estar fazendo algo útil.
O importante momento do ócio.
Algo raro de se fazer nos dias de hoje.
No livro "Roube Como um Artista", o autor Austin Kleon fala da necessidade do ócio para que a mente possa processar tudo que assimilou, processar e sintetizar. Esse não é um conceito de Kleon. Esse conceito remonta à Grécia Antiga e foi a base do que hoje conhecemos como escola, afinal, o termo escola vem do grego "σχολή" (scholē) que passa para o latim como "scholae" e significa ócio. Escola é ócio.
No livro, Kleon fala da importância de fazer atividades domésticas para que o corpo, enquanto faz atividades mecânicas e estruturadas, dê tempo ao cérebro para descansar da exaustiva tarefa de ter que analisar e elaborar tudo ao mesmo tempo e o tempo todo. Porém, mesmo quando vamos arrumar uma casa ou lavar uma louça, colocamos uma música, um vídeo, uma rádio, um podcast... alguma coisa que nos dê estimulo para a atividade que fomos treinados a considerar chatas e entediantes. Ficamos viciados em estimular nosso cérebro e essa não é uma boa notícia.
Aqui entra o ponto da série Bobbie Goods, o livro de colorir infantil que, nitidamente, está sendo comprado por adultos para serem pintados por adultos.
Primeiro que pintar é uma arte, assim como cantar, dançar e interpretar. Independente se você domina técnicas ou não, a arte não se restringe à sua aplicação profissional, mas também à aplicação amadora.
Pintar é uma atividade terapêutica e relaxante que ativa áreas do cérebro que possivelmente são pouco ativadas dando a oportunidade da outra parte do cérebro que está sempre ativa poder descansar.
Ora, se pintar trás tantos benefícios quanto ler, porque estamos indignados com o fato de um livro de pintar estar sendo o livro mais vendido?
Simples: o status da coisa!
Ler traz status.
Pintar com lápis de colorir tal como fazíamos na Pré-Escola e abandonamos o hábito só porque tivemos que priorizar outras disciplinas não dá status.
É infantil. Tolo.
Só que isso é uma inverdade e uma noção moldada na sociedade acelerada em que vivemos.
Não deixamos nosso cérebro descansar nem um minuto.
Eu mesma estou cansada de ler, principalmente após uma graduação de Letras na UFRJ. Enquanto estudava, queria ter liberdade de escolher o que ler sem carregar a culpa de estar lendo algo pelo lazer ao invés de ler algo pela obrigação. O prazer da atividade com culpa se perdia completamente. Eu quero descansar minha cabeça. Ainda nem tive tempo de absorver tudo que aprendi e eu preciso sair um pouco do quarto literário para poder me afastar e sentir falta do quarto literário também.
Ler é mais um estímulo para o cérebro. Requer concentração, foco e racionalização para interpretar o que a obra está dizendo.
Não entendam errado: ler traz enormes benefícios. Mas em uma era em que recebemos tantos estímulos o tempo todo e precisamos elaborar tantas coisas ao mesmo tempo, ler se torna mais uma sobrecarga ao nosso já cansado cérebro.
E é aí que entra um livro de pintura!
Se desligar de tudo. Deixar o cérebro descansar, enquanto os músculos dos dedos e dos olhos se concentram na atividade quase que mecânica de cobrir a página branca com uma cor diferente em cada contorno dado.
Ano passado tivemos uma polêmica entre a comunidade literária. Descobriu-se que muitas pessoas que diziam ler inúmeros livros por semana ou mês liam eram as sinopses ou pulavam parágrafos inteiros ou liam apenas diálogos. Somente para dizerem que estão lendo e somarem números na expectativa de que isso virasse status.
"Veja, li 5 livros essa semana. Quase um por dia!"
Não é viável. Você mal degustou sua leitura. Apenas passou os olhos e isso não ler.
Mas estamos sendo tão pressionados e cobrados em produzir e consumir que acabamos criando essas aberrações.
Aí, eu pergunto: não era melhor estar pitando e desenhando gravuras?
Acalma essa mente e permita ao seu cérebro o direito de descansar.
Vai pintar!
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